Aqui no Darwinianas já tratamos sobre vários aspectos da pandemia do novo coronavírus, SARS-Cov2. Em um post recente tratamos de uma nova possibilidade de vacina, através das vias aéreas superiores. Em outro post, tratamos sobre os movimentos anti-vacina. Caso ainda tenha dúvidas sobre a eficácia e o histórico sobre a vacinação, não deixa de ler esses textos. Felizmente, graças ao aumento do número de pessoas vacinadas, estamos observando uma redução importante no número de novos casos e de óbitos (Figura 1). Mesmo assim, a Fiocruz vem alertando sobre uma alta esperada devido ao inverno, estação do ano que historicamente registra maior incidência de doenças respiratórias. Nos EUA, depois de uma grande queda no número de novos casos e mortes relacionadas à COVID-19, infelizmente estamos observando aumento. Resumindo: ainda estamos em pandemia e todo o cuidado é pouco.

Figura 1 – Número de novos confirmados (A) e número de novos óbitos devido a Covid-19 (B) no Brasil. Fonte: Painel Rede Covida – Ciência, Informação e Solidariedade. Última Atualização: 29-07-2021 às 20:47h.Fonte de Dados: Ministério da Saúde e Secretárias Estaduaishttps://covid19br.wcota.me/.
Com as melhoras momentâneas, com a liberação de espaços públicos pelas autoridades e depois de tanto tempo de confinamento e distanciamento social, as pessoas de modo geral tendem a querer retomar as atividades sociais de modo bem intenso. Aqui em Salvador, por exemplo, podemos testemunhar praias lotadas neste final de semana, mesmo com ventos fortes e céu nublado. Desde o início da pandemia, muitas pessoas não têm usado máscaras, enquanto outras usam de modo equivocado, deixando o nariz e às vezes até a boca do lado de fora. Agora, com o aumento da vacinação e com a redução do número de casos, mais pessoas estão abandonando totalmente o uso de máscaras, o que não é uma decisão apropriada.
Outra questão diz respeito à escolha por máscaras adequadas. Muitas vezes há dúvidas sobre que tipo de máscara deve ser usada. As de pano, cirúrgicas ou de maior proteção, como a N95? Essa dúvida é genuína e há muita informação contrastante nas redes. Até pouco tempo havia falta de evidências empíricas sobre a efetividade e o risco de cada tipo de máscara como meio de evitar contaminação pelo SARS-CoV-2.
Hoje, sabemos com mais segurança que a transmissão da Covid-19 se dá majoritariamente por perdigotos e aerossóis. Sabemos também que as máscaras de proteção são importantes para prevenir que as pessoas contraiam a doença, reduzindo a inalação de partículas virais, mas também para que não a transmitam, reduzindo a sua emissão (ver abaixo em “Para Saber Mais”). Até então, na literatura científica, as evidências eram muito contrastantes sobre a efetividade do uso de máscaras na proteção contra o vírus. Por um lado, alguns estudos mostravam que a penetração viral pode ser considerável em máscaras cirúrgicas e até mesmo em máscaras de maior nível de proteção, como as PFF2 e as N95, e que, em casos de alta emissão de partículas, em espirros e tosse, aumenta a probabilidade de penetração de carga viral considerável através das máscaras. Além disso, em estudos clínicos, não se chegou a resultados conclusivos sobre a efetividade das máscaras contra a Covid-19. Por outro lado, diversas observações mostram que regiões ou instituições com alto percentual da população aderindo ao uso de máscaras têm melhor controle da doença. Em estudo recente publicado no dia 25 de junho de 2021, na revista Science, pesquisadores investigaram a efetividade das máscaras para proteção contra o vírus SARs-CoV-2, causador da Covid-19, utilizando modelos matemáticos.
Neste artigo, os autores desenvolveram um modelo quantitativo que estima a eficiência das máscaras, considerando a abundância de partículas virais no ambiente, ou seja, se o ar está muito “lotado” ou não de vírus. Os autores encontraram que a eficiência das máscaras depende profundamente da quantidade de vírus presente no ambiente (Figura 2). Por exemplo, em ambientes fechados, onde reconhecidamente há mais pessoas contaminadas, como em hospitais, as chances de contaminação são muito mais altas. Neste caso devemos procurar usar máscaras com menores taxas de penetração, como PFF2 e N95. Em ambientes abertos, com menos concentração viral, as máscaras cirúrgicas são mais efetivas, segundo o estudo.

Figura 2 – Representação esquemática de ambientes com alta (A) e baixa (B) abundância viral e eficácia das máscaras de proteção. Fonte: Imagem modificada do artigo Cheng e colaboradores (2021).
Agora você pode estar exclamando: “mas isso é obvio!”… será?! A partir dos resultados deste trabalho podemos medir um pouco melhor nosso comportamento e procurar mais proteção a depender do ambiente que estamos. Assim, podemos evitar custos excessivos com máscaras de altíssima proteção para frequentar ambientes abertos, com poucas pessoas, com distanciamento entre pessoas. Podemos também intensificar a proteção usando máscaras adequadas para ambientes fechados e com alta concentração de pessoas, o que aumenta por sua vez a probabilidade maior abundância viral.
O que era senso comum passou a ser evidência científica gerada por modelos matemáticos. O distanciamento físico entre as pessoas em ambientes abertos, associado a uso de máscaras, é ainda muito importante para barrarmos os avanços da pandemia, mesmo neste cenário atual, onde parte da população brasileira está vacinados. Não temos bola de cristal e não podemos prever o futuro, mas sabemos que cepas mais virulentas do vírus estão circulando em diversos países. Por isso, não custa muito continuarmos usando as máscaras de modo adequado.
Pedro Milet Meirelles
Laboratório de Bioinformática e Ecologia Microbiana
Instituto de Biologia da UFBA
Para Saber mais:
Grinshpun, Sergey A., et al. “Performance of an N95 filtering facepiece particulate respirator and a surgical mask during human breathing: two pathways for particle penetration.” Journal of occupational and environmental hygiene 6.10 (2009): 593-603.
Chu, Derek K., et al. “Physical distancing, face masks, and eye protection to prevent person-to-person transmission of SARS-CoV-2 and COVID-19: a systematic review and meta-analysis.” The lancet 395.10242 (2020): 1973-1987.
Zhang, Renyi, et al. “Identifying airborne transmission as the dominant route for the spread of COVID-19.” Proceedings of the National Academy of Sciences 117.26 (2020): 14857-14863.
Brooks, John T., Jay C. Butler, and Robert R. Redfield. “Universal masking to prevent SARS-CoV-2 transmission—the time is now.” Jama 324.7 (2020): 635-637.
Uma consideração sobre “A pandemia não acabou, que máscara devo usar para evitar a Covid-19?”