Em um post recente aqui no Darwinianas, a Profa. Ana Almeida trouxe informações importantes sobre como os microrganismos influenciam o comportamento de moscas e nos trouxe questionamentos interessantes sobre quem está no comando do nosso próprio comportamento. No post de hoje veremos como os microrganismos que habitam nosso intestino podem estar relacionados com nossa qualidade de vida e saúde mental, mais especificamente: como os microrganismos estão relacionados à depressão.
A depressão é a desordem mental mais prevalente em países industrializados. No Brasil, país líder em incidência de ansiedade e depressão na América Latina, os números são assustadores e crescem: 5,8% dos brasileiros sofrem com a depressão, nos últimos 10 anos houve um aumento de 18,4% do número de pessoas que sofrem com depressão. É bem conhecido que os tratamentos para esse mal podem demorar e que nem sempre os medicamentos funcionam de primeira, tendo o paciente que se sujeitar a algumas drogas para melhorar o seu quadro. São também conhecidos os efeitos colaterais que as drogas administradas podem causar nos pacientes. Porém com todo esse quadro, podemos vislumbrar um horizonte promissor na compreensão das causas e possíveis tratamentos mais eficazes da depressão. Em estudo publicado na semana passada na Nature Microbiology, pesquisadores da Bélgica, liderados pelo Prof. Jaroen Raes, mostraram associações entre a microbiota intestinal e depressão.
Este estudo foi feito com um grupo de mais de mil pessoas, através do projeto “The Flemish Gut Flora project”. Os autores empregaram abordagens metagenômicas (nos meus posts anteriores falei um pouco sobre o que é isso), que é o sequenciamento de todo material genético presente em uma dada amostra, para acessar a diversidade microbiana nessa população e, utilizando informações sobre vias e compostos conhecidos como importantes moduladores cerebrais, conseguiram traçar associações claras entre alguns microrganismos e qualidade de vida e depressão. Os resultados apontam para a hipótese de que bactérias produtoras de butirato (Faecalibacterium e Coprococcus) podem estar relacionadas com altos indicadores de qualidade de vida. Em indivíduos com quadros de depressão, as bactérias Dialister e Coprococcus spp. encontravam-se ausentes. Os autores encontraram também que a síntese microbiana do metabólito de dopamina, ácido 3,4-dihydroxifenolacético, está correlacionada positivamente com qualidade de vida mental, e o potencial das bactérias produzirem ácido γ-aminobutírico em casos de depressão. A produção ou degradação desses compostos estão relacionados diretamente com a produção de neurotransmissores e, por consequência, tem relação com a fisiologia cerebral.
É importante ressaltar que o estudo traz associações e que não é possível ainda estabelecer relacõed de causalidade. Apesar disso, a pesquisa dá luz a uma compreensão mais abrangente sobre o funcionamento do corpo humano, mostrando ligações entre o nosso intestino e estado mental, e também oferece meios de testar os achados. A medicina está evoluindo cada vez mais para ser totalmente personalizada, incluindo informações dos genomas dos pacientes e, cada vez mais, do microbioma também. Podemos vislumbrar tratamentos baseados em administração de compostos produzidos por cada tipo de microbioma (saudável e doente) ou baseados na administração ou controle dos microrganismos intestinais. Mais uma vez aqui no Darwinianas fica a pergunta: quem está no controle do nosso próprio comportamento?
Pedro Milet Meirelles
Laboratório de Bioinformática e Ecologia Microbiana
Instituto de Biologia da UFBA
Para Saber mais:
(Imagem: https://www.talkspace.com/blog/2017/09/the-stigma-of-depression/)
Bastante interessante!
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